Thursday, September 14, 2006

Regresso à aritmética

Do Público de hoje:

Regresso à aritmética
José Manuel Fernandes

Um relatório americano acaba de propor um regresso às origens no ensino da Matemática.
O que passa por ensinar bem aritmética e valorizar tanto a tabuada como divisões com números decimais. Sem a ajuda de máquinas calculadoras

Em 1989, o Conselho Nacional dos Professores de Matemática dos Estados Unidos produziu uma recomendação sobre a forma como a disciplina devia ser ensinada que, entre outros pontos polémicos, aconselhava a que as crianças fossem ensinadas a utilizar máquinas de calcular logo no pré-escolar ou mesmo nos jardins-de-infância.

Operações aritméticas simples, como dividir 120 por 40, deviam ser resolvidas não pelos métodos clássicos, mas fazendo as crianças "descobrir" a solução utilizando conjuntos de círculos.

Apesar da fúria dos professores universitários e da perplexidade de muitos pais, a recomendação fez escola e tornou-se regra na maioria dos estabelecimentos de ensino de um país onde não existe um programa único, sendo os curricula escolares definidos a nível estadual ou mesmo local.

Dessa forma se chegou à actual situação em que apenas 12 dos 50 estados dos EUA haviam colocado entre as obrigações mínimas de aprendizagem saber a tabuada.
O resultado deste tipo de recomendações levou a que, nos testes comparativos internacionais, os jovens dos Estados Unidos começassem a obter cada vez piores resultados.

O alerta soou, uma parte dos professores começou a mudar de métodos e algumas escolas resolveram fazer o mais sensato: esquecer as velhas recomendações do "modernaço" Conselho e, em vez disso, passar a seguir o programa adoptado no país que sistematicamente fica no topo da tabela: Singapura. Em poucos anos os alunos dessas escolas, mesmo de algumas que recebem sobretudo filhos de imigrantes pobres, melhoraram de forma dramática.

Não surpreende por isso que esta semana o Conselho Nacional dos Professores de Matemática tenha produzido um relatório onde se preconiza o regresso aos bons velhos métodos, isto é, a saber multiplicar e dividir, a saber realizar divisões complexas com casas decimais, a saber somar fracções e por aí adiante.

Em 1989 preconizava-se que não se pedisse às crianças que dividissem 4783 por 13, mas sim por 12, pois daria um resultado próximo de 400, o que lhes permitiria verificar se, pasme-se, ao realizarem a mesma operação na calculadora não se teriam enganado ao pressionar uma tecla. Agora recomenda-se exactamente o contrário.

O novo relatório segue assim um caminho diferente pois, entre outras coisas, estabelece que competências mínimas se devem atingir em cada grau de ensino, recomendações que incluem as velhas contas que exigem o recurso ao papel e ao lápis e, no fim, requerem a verificação pela prova dos nove.

Deixa-se de pedir às crianças que "descubram" o seu próprio caminho para resolver um problema de aritmética, antes se lhes pede que aprendam regras simples que, desde Arquimedes, não necessitam de ser "redescobertas", apenas entendidas e bem aplicadas.

Num país cujos alunos registam ainda piores resultados do que os americanos nas provas comparadas de Matemática (e bem piores do que os alunos de famílias pobres das escolas que optaram por seguir o modelo de Singapura), talvez não valha a pena multiplicar comissões para "descobrir a roda".

Leia-se antes o relatório a que nos temos vindo a referir, acrescente-se-lhe um outro que deverá sair esta semana e foi encomendado pelas autoridades federais e dê-se uma olhada nos programas adoptados em Singapura. Há lá muito a aprender para depois melhor ensinar Matemática.


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